- Já fez as malas? - perguntou-me com um brilho característico nos olhos.
- Separei algumas roupas e documentos.
- Quanto tempo ficará fora?
- Um mês, não mais.
Enquanto eu terminava de escrever a lista de coisas que tinha para fazer antes da viagem, pausadamente me lançava perguntas. Até que afirmou:
- Ainda não nos separamos por tanto tempo, não é mesmo?
Aquela era a frase que eu temia ouvir. Havia passado os dias resolvendo problemas, organizando roteiros, delegando funções, tudo para não precisar deparar-me com aquela pergunta.
- É verdade - respondi dissimulando despreocupação.
- Vou sentir a tua falta.
Aquilo era demais para meu coração. Eu também sentiria sua falta, mas precisava ir. Esta viagem estava além das expectativas turísticas, seria o meu grande retorno ao lar, às minha origens. Consistiria na busca de um eu nostálgico, de um passado que não havia vivido. Seria o divisor de águas entre o ontem da minha vida e o amanhã. Eu precisava ir.
Sentou-se ao meu lado, pegou minha mão e a beijou. Senti-me anciã, a velha avó cujo neto pede bênção. E um nó em minha garganta se formou. Levantei seu rosto e olhando em seus olhos grandes como duas jabuticabas, lhe disse:
- Você sabe o quanto é importante para mim, não sabe? Algumas pessoas são importantes porque marcam um momento da nossa história. São nossos amigos da escola, da igreja, de algum curso que fazemos. Outros até são nossos amigos virtuais. Algumas pessoas marcaram a nossa vida porque nos fizeram rir, nos amaram por um momento, nos ofereceram seu ombro quando precisamos. Outras marcam a nossa vida por terem feito justamente o contrário disso tudo. E, em algum momento nos recordaremos delas.
Ouvia-me com a mesma atenção de sempre. Então continuei:
- Há pessoas que conseguem muito mais do que marcar momentos importantes, elas se tornam importantes em nossa vida. Estas não são esquecidas, mesmo que estejamos longe, mesmo que fiquemos tempos sem nos encontrar. Quando nossos irmãos crescem e saem de casa, ficamos tempos sem vê-los, mas nunca nos esquecemos de que temos irmãos. Algumas pessoas são assim, você é assim para mim.
- Então você se lembrará de mim? Perguntou em tom mais alegre.
- Eu não precisarei me lembrar de você, justamente porque não é possível te esquecer.
E com seus bracinhos de criança e o coração inocente, me abraçou como me abençoando.