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quinta-feira, 8 de maio de 2014

Terá chegado a minha hora?

        Da minha nova janela vejo muitas luzes e não mais árvores. O céu é cinza e um constante fogo sai das chaminés da petroquímica, não há mais estrelas. O ruído vem dos carros e não do canto dos pássaros. Os móveis são novos e modernos. O chão é de madeira, macio, macio. O banheiro é só meu, e pelo que tudo indica, ninguém mais poderá me pedir para me retirar. Será verdade? A vida, esta mesma estranha e traiçoeira, não estará preparando uma nova surpresa? Pode ser que sim, mas para quem recomeçou várias vezes, isto até que seria normal.

         O colchão aos poucos é marcado pelo formato do meu corpo. A cadeira da escrivaninha se modela ao meu jeito indígena de sentar. A xícara nova passa a ser conhecida em sua medida, a mesa da sala de jantar me reserva um lugar na ponta direita. O sofá da sala se acostuma com meu corpo em forma de caracol. Memorizar os canais de televisão, onde acendem as luzes e como não se bater nas quinas ainda me custará um tempo. Estar com a porta sempre fechada à chave, abrir três portões e estacionar o carro numa vaga que me exigirá nunca passar dos sessenta quilos para não ficar presa dentro dele são algumas das minhas novas alegrias. 

           Não há mais jardim e as plantas dos vasos já morreram, porque assim como meus amores, não sei cultivar plantas presas em vasos. Os cachorros, meus companheirinhos, tive de deixá-los com o coração sangrando, já que aqui não há espaço para eles. 

          É a dinâmica da minha vida, o que posso fazer? Longe de mim desejar que tal afirmação soe como um conformismo, pelo contrário, é mais provável que eu nunca me conforme com as dores que tal processo me causa. Levantar, construir, edificar e deixar obrigatoriamente para o outro. Zerar, levantar, construir...outro. Lamúrias à parte, esta postagem após tantos meses não quer cultivar a melancolia, nem a revolta, nem a mágoa e muito menos a incompreensão dos fatos. Esta postagem quer dar graças ao novo amanhecer que surge, ao novo ciclo que se abre e dar boas vindas à força que como um vulcão começa a eclodir.

          Posso ver meu corpo envelhecendo, minha pele ficando marcada e estranha, e ainda, me dar conta de que meus peitos estão caídos. Isso mesmo, após tanto tempo usando sutiã de bojo, vi refletido no espelho da academia, meus pequenos peitos num top de lycra, caídos e flácidos. É bem estranho, aliás, nosso corpo sempre nos é estranho. 

          A visão dos peitos não sobrepôs a visão dos músculos que aos poucos se formam. Do tórax que se expande, da coluna que se fortalece ereta, das coxas que se delineiam. Os pesos já não pesam como antes e o tempo na esteira não parece demorar a passar. Há uma reserva de força em meu corpo que quer se manifestar para permitir que minha mente descanse um pouco. E, ao contrário das outras vezes, em que cuidei do outro, depois cuidei do jardim, agora cuido única e exclusivamente de mim. Terá chegado a minha hora?


       

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