"Façamos o homem a nossa imagem e semelhança", disseram que foi isso o que Deus disse. No plural. Por diversas vezes esta frase surgiu em minha mente estes dias. Não leio a bíblia faz muito tempo e nem me interessa mais discutir teologia. "Façamos o homem a nossa imagem e semelhança". "Façamos o homem a nossa imagem e semelhança". "Façamos...semelhança." "...o homem..." "Façamos o homem...". "...o homem semelhança". Mas o que isto quer dizer?!
Qual o sentido de tudo isto? Há sentido? De quê vale perguntar por quê, se nunca teremos resposta? De quê vale refletir e refletir sobre as possíveis causas se as respostas podem ser tantas e nenhuma?
Fui a última pessoa a vê-lo consciente. Por quê? Quem me responderá? Fui a pessoa que assinou os papéis de sua internação, numa escala hierárquica responsavelmente distante. Por quê? Fui eu quem testemunhei o desespero de minha avó ao vê-lo entubado e inconsciente. Por quê? Alguém me explicará? Sei que não.
- Ele está gelado! Ele não acorda! Acorda meu filho! Abre os olhos, filho! Ele não acorda...Ele não volta mais, né?
- Não, vó. Ele não volta mais.
Por que fora eu a dizer-lhe? Onde estão os outros? Onde estão todos que não aparecem para permitir-me enfraquecer? Os outros já se foram...um a um, sem explicações se foram...Se ao menos eu conseguisse crer...Se ao menos eu tivesse a esperança de um reencontro...Se ao menos eu tivesse as visões, sensações, pressentimentos que tantos outros têm...Nada me é explicado. E quando penso haver encontrado um suporte, um colo, um apoio, um alguém onde eu possa ser frágil, me decepciono novamente, como se fosse a primeira vez. "Você está bem?" É uma pergunta retórica, porque se tento explicar e dizer que não! Que estou cansada, chateada, triste...ouço de volta "...tá, tá, depois a gente conversa".
"Façamos o homem...a nossa imagem e semelhança". Para quê Deus faria isto? Se não temos parâmetro, como vamos saber a quem nos assemelhamos? Todos os saberes teóricos e teológicos nunca deram conta. Os psicológicos me mantêm um pouco em pé, os filosóficos anestesiam minha consciência e por um breve período deixo de sentir dor. Mas hoje eu clamo pelo afetivo, pelo abraço apertado, pelo calor do corpo, pelo cheiro...mas ele não vêm.
Estou tão cansada de perguntar. Nem sei mais se as respostas adiantariam. Talvez elas se transformariam em sementes de novas perguntas, pois minha sede de saber é imensa. O tudo do nada que sei é que ainda tenho a vida.
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