Percebi seus olhos sobre meus ombros e não pude deixar de sentir sua respiração suave e profunda. Delicadamente beijou-me a face e se foi, dissipando-se no espaço entre dois mundos. Não era preciso dizer uma única palavra, eu sabia que aquela era sua forma de desejar-me boa noite. Permaneci escrevendo, buscando as palavras que imprimissem na tela branca o significado dos meus sentimentos. Escrevia e deletava, deletava e escrevia.
Todas as noites era o mesmo ritual. Eu me sentava, girava a poltrona num movimento um tanto desesperado por organizar os afazeres. Ponderava as urgências e me punha a trabalhar. Lia, relia, imprimia, rabiscava. As horas passavam sem que eu percebesse, se não fosse pela fome e a dor nas costas a implorar-me pela pausa, eu me abandonaria na dança nas letras até a exaustão.
Para que tantas urgências, obrigações e correrias? Não poderia eu apenas deleitar-me na escrita de meus confusos pensamentos? Sentar-me no sofá e embriagar-me de imagens desconexas? Qual a necessidade de tantos papéis sobre a escrivaninha, livros abertos, temas diferentes para discutir e ponderar? Qual a importância disto para o mundo?
O porta retrato laranja com os seis ao meu redor por vezes me distraía. "Onde estariam os cinco agora?" "Quais caminhos trilhavam?" "Que escolhas e decisões haviam tomado?" De um ou outro lugar surgia alguma breve notícia: "Está terminando a faculdade em outro Estado." "Você não sabe? Se casou com um gringo e foi morar na Europa." Seus medos e inseguranças estariam superados? Desejava que fossem felizes e que o sorriso inocente daquela foto ainda iluminassem seus jovens rostos.
Desperta de meus devaneios, meus olhos voltavam ao caderno vertical e minhas mãos já cansadas se moviam sem ritmo certo. Ora rápidas pela pressa de não perder a ideia, ora lentas pela incerteza de registrá-la. No dia seguinte, exausta pela noite de trabalho e movendo-me como se meu corpo fosse algo extra, recebia seu abraço matinal: "Dormiu bem?" Respondia-lhe vagarosamente para que cada segundo demorasse mais: "Dormi, mas ainda estou cansada." Sorria-me como quem já esperasse por tal resposta e sem mais delongas ia-se para voltar ao anoitecer.
O porta retrato laranja com os seis ao meu redor por vezes me distraía. "Onde estariam os cinco agora?" "Quais caminhos trilhavam?" "Que escolhas e decisões haviam tomado?" De um ou outro lugar surgia alguma breve notícia: "Está terminando a faculdade em outro Estado." "Você não sabe? Se casou com um gringo e foi morar na Europa." Seus medos e inseguranças estariam superados? Desejava que fossem felizes e que o sorriso inocente daquela foto ainda iluminassem seus jovens rostos.
Desperta de meus devaneios, meus olhos voltavam ao caderno vertical e minhas mãos já cansadas se moviam sem ritmo certo. Ora rápidas pela pressa de não perder a ideia, ora lentas pela incerteza de registrá-la. No dia seguinte, exausta pela noite de trabalho e movendo-me como se meu corpo fosse algo extra, recebia seu abraço matinal: "Dormiu bem?" Respondia-lhe vagarosamente para que cada segundo demorasse mais: "Dormi, mas ainda estou cansada." Sorria-me como quem já esperasse por tal resposta e sem mais delongas ia-se para voltar ao anoitecer.