Acabei de tomar meu último
banho. É engraçado pensar assim. Na verdade só me dei conta quando já estava
debaixo do chuveiro. Não que isto seja tão relevante, mas a simbologia das
datas afeta de algum modo nosso psiquismo. Vemo-nos movidos às releituras,
resgates pessoais, somos impelidos às novas posturas, enfim, cremos que um novo
ciclo termina e outro inicia.
Muitas datas nos remetem a
tais contextos, Natal, Ano Novo, Páscoa, mas, o aniversário de nascimento é sui generis. Mesmo que outra pessoa faça
aniversário no mesmo dia, consideramos nosso, apenas nosso aquele momento. O
momento em que saímos do ventre, da bolha d’água, do seio materno e entramos
para o mundo.
O ventre é como uma espécie de
plataforma. Viemos de um lugar e agora esperamos para ir a outro. É o lugar do
nada, da espera, do silêncio, da individualidade e da solidão. É o lugar perfeito
para aprender a esperar. Esperamos que haja para nós um abrigo, leite, colo e
sorrisos. Esperamos que nos ensinem a falar, a andar, a controlar nossas
necessidades mais básicas. Esperamos que conversem conosco, que nos considerem
nas conversas e que nos levem a passear. Esperamos que nos aceitem como surgimos
e nos amem. Amem-nos da maneira mais intensa que puderem.
Não somos passivos na espera. Tudo
em nós se transforma. Tudo surge. Cada órgão ao seu tempo. E sem que percebamos
este ciclo se repete a cada dia, a cada ano, a cada decisão que tomamos. Cada vez
que chega aquele dia, renovamos nossa espera. Espera de realizações que ainda
não se realizaram. Espera de experiências que ainda não tivemos. De amores que
ainda não vivemos.
Não sei exatamente como devo me sentir, pois quase nunca consigo relacionar minha idade às convenções sociais. Por vezes sinto-me cansada, como se já houvera vivido oitenta anos. Por outras, sinto-me como se nunca houvesse saído da adolescência. Há certo conflito em mim.
Alguns trens já passaram e não
voltarão. Já para outros não há garantias de que passarão por esta plataforma. Resta-me
esperar. Assim como esperei no ventre materno. Esperar o que de fato importa e
faz sentido.
Esperar o momento do
reencontro, do vir a ser, da colheita de tudo o que se plantou, da surpresa
agradável que nos muda de plataforma, dos contratempos, do inevitável, do
acaso, da noite e do dia outra e outra vez.
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