Ontem foi Páscoa e desde que minha avó paterna faleceu não como mais bacalhau na Páscoa. Esta era uma tradição de sua casa, portuguesa da Ilha da Madeira, o bacalhau com batata e grão de bico nunca faltava.
Havia um ritual, algum filho levava o peixe e ela o preparava com batatas, cebolas, grão de bico e muito azeite. Cada um comia a parte que mais gostava, eu sinceramente adorava as batatas. Depois nos jogávamos pelos colchões no chão e descansávamos amontoados. Era divertido tirar fotografias da minha avó dormindo esparramada pelo chão.
Mas tudo acabou, um a um eles se foram para o nunca mais, levando consigo o nosso conceito de família. E a Páscoa assim como outras datas são apenas datas. Quando eu poderia pensar que pasaria o dia da ressurreição de Cristo numa cidade cuja principal característica é o misticismo e ainda com um grupo de pessoas que mal conheço.
Eu pensei em cada um, observei cada um e aos poucos entendi. São gente como eu, que de alguma maneira estão sós, divorciados, solteirões, desarrumados, traumatizados. Todos tentando reviver algumas alegrias e sensações da juventude, seja na velocidade da moto, seja nas diversões consumíveis, seja nas cordas de um violão.
Fui acordada pelas músicas da igreja matriz de São Thomé, as mesmas que eu cantava, e me senti mal. Eu não pertenço mais àquela vida, mas também não sei ainda à qual pertenço. Estamos todos em busca de um lugar para ser feliz, a Páscoa poderia ser um bom lugar, pois ressuscitar é ter uma segunda chance.
Discussões teológicas à parte, os evangelhos dizerm que Jesus ressuscitou, apareceu para seus discípulos e lhes mandou que tocassem suas chagas, principalmente São Thomé. Por que suas chagas não desapareceram? Não seria mais miraculoso? Isto me faz pensar que o ressurgir não significa apagar nossas memórias, nossa história, nossas dores e sofrimentos, mas acima de tudo, ressignificá-los. Que todos os dias morremos e ressuscitamos e que isto não é um processo miraculoso e sublime, é a própria dinâmica da vida.
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