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quarta-feira, 31 de julho de 2013

A cética e a atéia

        "A razão de ser das religiões é alterar a morte". Abujamra       

       Minha amiga ateia, vou te contar um pouco de meu ceticismo...
   
     Perguntas como "quem sou eu?", "de onde vim?", "aonde vou?", "para que estou neste mundo?" me acompanham desde a adolescência, na verdade, creio que questões metafísicas me acompanham desde a infância, pois recordo-me de quando tinha sete anos e descobri que o tempo não volta atrás, que cada dia vivido, cada hora, cada minuto que passou nunca mais voltará. Quando minha mãe me explicou isso eu me enfiei debaixo da cama e chorei, fiquei em estado depressivo olhando para um relógio de pulso e pensando que nunca mais viveria aquele mesmo momento. 

         Passei minha infância me revezando entre um terreiro de umbanda e a igreja católica. Vi coisas acontecerem dentro da minha casa que amedrontariam muita gente, como copo voando de cima do criado mudo sem que ninguém o tocasse ou de cima da mesa, livro caindo da prateleira, portas do guarda-roupa abrindo sem ninguém as abrir. 

        Vi vários trabalhos umbandistas no terreiro e na praia, fui até batizada no mar, sou afilhada de Iemanjá. E nunca minha cabeça e meu coração conseguiram acreditar que aquelas situações fossem a representação, ou a exibição, ou o contato direto com o mundo sobrenatural, o além, o céu, ou qualquer outro nome. 

        Neste intervalo houve também o contato com o Espiritismo, a mesa branca, como eu ouvia chamarem. Não havia guias, bebidas, charutos ou oferendas, mas havia a mesma dinâmica de contato com o além. E mesmo assim meu coração nunca conseguiu acreditar e nem minha cabeça encontrar lógica nisto. 

        Finalmente decidi por seguir o catolicismo, não que me agradasse as doutrinas e dogmas ou as práticas ou mesmo a maneira de interpretar o além. Eu gostava mesmo era da prática social daquela igreja engajada que conheci, com o pé no chão, na história, que buscava dar voz aos que não tinham voz, acolher os necessitados e devolver-lhes a dignidade. Eu gostava dos mártires e não dos santos. Eu rezava para o Cristo revolucionário e não para o bom-pastor. 

        Quando depois tive contato com a Filosofia comecei a entender que as minhas perguntas tinham respostas neste mundo e tudo passou a fazer sentido. Meu "affair" com o sagrado continuou, creio que até se intensificou, mas não com a mentalidade mítica, mas científica. Quanto mais científico mais prazeroso ficava nosso relacionamento, pois eu pensava que somente um ser superior poderia criar coisas tão sublimes.

        Paralelo a isto alguns sentimentos ainda predominavam e vez ou outra estava eu numa espiral depressiva, confusa, em papos-de-aranha como se costumava dizer. E lá ia eu em busca da ciência, das explicações concretas, lógicas, plausíveis e certificadas pelas pesquisas. Me levantava e caminhava novamente até uma nova crise aparecer. 

        Hoje estou novamente numa encruzilhada, dessas em que as pessoas costumam sucumbir à alguma doutrina, mas eu reluto porque nenhuma delas faz mais sentido do que tudo o que ainda não sei cientificamente, mas já se descobriu. 

        Observo que uma questão me acompanha em praticamente todas as situações difíceis. Nas crises que vivi há um mesmo pano de fundo, com personagens diferentes e em ambientes diferentes. Mas o incômodo é o mesmo. O catolicismo não me responde esta pergunta, apenas me propõe mecanismos de aceitação e identificação com o Cristo sofredor, o que não me resolve muita coisa. O espiritismo me propõe que a causa disso tudo está em vidas passadas e que devo resgatar algo, o que também não aceito, porque é preciso saber o que se tem para resgatar. 

        Prefiro acreditar que assim como herdamos a cor dos olhos, a estatura, a cor de pele, algumas enfermidades e tantas outras características de nossos pais, avós e ancestrais, também herdamos seus traumas e suas experiências mais significativas. Posso acreditar piamente que uma pessoa tenha pânico de aranha, por exemplo, sem nunca haver vivido uma situação traumática com uma aranha, mas porque sua avó materna que vivia na roça, vivera uma situação traumática com uma aranha, registrando-a em sua memória, portanto em seu "DNA psicológico", e transmitido-a às outras gerações. 

        Posso acreditar que uma compulsão por economizar algo, comida, por exemplo, mesmo a pessoa sendo farta, venha do trauma vivido por seu avó no pós-guerra. E assim por diante, pois estas experiências ficam registradas em nosso corpo, criando um DNA de memórias traumáticas. Eu sou o resultado de várias memórias, de duas famílias que se ramificam ao infinito e como saber de quem herdei determinados sentimentos, sensações e traumas? É mais prático crer em minhas vidas passadas. 

        Sempre fui fascinada pela história da minha família. Sou a portadora das fotos e dos álbuns de família. Tive bisavó até o ano passado e gostava de escutar suas histórias sobre meus tataravós. Quanto destas pessoas não está em mim? Da negra escrava, do sírio mascate, do italiano e do português imigrante? Quanto da minha nostalgia, da minha "saudade de não sei o quê" provem destas saudades vividas por eles? Quanto do meu sentimento de rejeição, de "persona no grata" vem do sentimento e da vida de imigrantes que eles viveram? 

        Pode ser que mesmo que houvesse um exame de DNA que comprovasse de onde vem cada trauma que carrego, sem contar os que surgiram do meio, mesmo assim, não tenho a certeza de que estaria isenta de senti-los. Creio que o segredo está em re-significá-los, em produzir novas memórias, inclusive já há pesquisas assim com ratos para ajudar pessoas com o Mal de Alzheimer. E neste caso, aceito que cada um busque uma maneira positiva para tal, inclusive crer que sua existência atual esteja vinculada à existências passadas, pois se existe mesmo Deus, se viemos Dele e para Ele voltaremos, no fim das contas, Ele não levará nada disso em consideração para nos receber de volta em seus braços.  

                                                                                                Assinado: Cética



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