Sobraram três palitos na velha caixa de fósforos, todos os outros já haviam abraçado seus destinos. Alguns se conheceram mais, outros nem tanto. Como nenhum dos três sabia exatamente a hora em que iriam, resolveram gastar o tempo se conhecendo.
- Olá, sou Paliti.
- Oi, sou Palitê.
- E eu sou Palitá.
E começaram uma interessante conversa a respeito de suas origens, das árvores de onde vieram, dos campos onde viveram quando ainda faziam parte da natureza e dos sonhos que tinham.
- Eu vim de uma árvore velha e frondosa - disse Paliti. Quando fecho os olhos ainda posso sentir o carinho do vento. Era tão lindo o nascer do sol, o barulho da água correndo no rio, o canto dos pássaros. Eu adorava a explosão de cores na primavera. Eu gostaria de acender uma artilharia de fogos de artifício, só pra ver pela última vez uma explosão de cores.
Palitê e Palitá se emocionaram com a narrativa de Paliti. Pensaram que tinham histórias diferentes e que também desejavam compartilhá-las.
- Eu não vim de uma árvore velha e frondosa - disse Palitê - Eu vim de uma árvore pequena e frágil que mal aguentava as rajadas de vento. Aliás, o vento sempre me assustava e eu achava o sol pouco carinhoso, ele queimava as minhas folhas e os insetos me incomodavam. Alguns pássaros eram muito pesados para os meus galhos e eu sempre tinha a sensação de que a qualquer momento me quebraria. Eu gostaria de acender uma fogueira bem alta de onde fosse possível ouvir o estalar do fogo.
Paliti e Palitá se olharam e nada desejaram comentar, apenas sorriram para Palitê um sorriso acolhedor.
- E você Palitá? - perguntou Paliti - qual é a tua história?
- A minha história é diferente - começou Palitá - não vivi sempre no mesmo lugar. Eu sou parte de uma árvore transplantada quando ainda era pequena, que cresceu numa terra fértil, mas longe de sua terra de origem. Eu fui feliz, me diverti muito com o balançar do vento, eu sentia cócegas. Gostava de receber os raios solares e brincar de sombra com minhas folhas. Os pássaros me encantavam com seus ninhos, era uma festa quando nasciam os filhotes. Os insetos para mim eram visitas, eu não me importava em recebê-los. Até que um dia as coisas foram mudando e as diversões já não me satisfaziam tanto. Faltava alguma coisa, mas eu não sabia o quê.
- E você descobriu o que era? - perguntou Palitê.
- Na verdade não.
- Acho que você começou a sentir falta da tua terra natal - comentou Paliti.
- Não creio, lá não era bom para viver.
- Você se lembra de como era? - insistiu Palitê.
- Lembro-me um pouco, mas as outras árvores me disseram que muitas coisas ruins haviam acontecido naquelas terras quando eu ainda era uma semente.
Paliti e Palitê se olharam e compreenderam que a mesma dúvida pairava sobre suas cabeças. Então, delicadamente Paliti arriscou:
- Acho que esta falta que você sentia era a falta das tuas origens, da tua terra materna. Você nunca desejou voltar?
- Não queria voltar para um lugar ruim, eu era feliz onde estava.
- Toda situação tem dois lados e toda história duas versões, Palitá. Você conhecia a versão de quando fazia parte de uma árvore pequena que entendia e pensava como árvore pequena, mas ela cresceu, poderia pensar e entender como árvore grande. Quem sabe, ao conhecer as duas versões você pudesse compreender o que faltava. E agora, o que você deseja acender? - concluiu Palitê.
- Eu gostaria de acender as velas de um templo.
E sobre seus sonhos ainda conversaram, até que uma mão levou Paliti e Palitê, deixando que Palitá caisse no chão e fosse levado pelo vento à terras ainda mais distantes. Um monge pobre e em peregrinação, caminhando de cabeça baixa encontrou o palito que faltava para reacender sua vela e continuar sua caminhada rumo à terras conhecidas.