Lá fora chove. De minha cama escuto a chuva e percebo ao redor o silêncio da casa, casa que deixarei em breve, não tão breve como uma semana ou um mês, mas breve. Pela primeira vez, de tantas outras, a deixarei para morar na minha casa. Algo me diz que será para sempre. Quanto tempo dura o para sempre?
Não terei mais que conviver com as paredes mofadas, com o acabamento antigo, com os canos estourados, com as teias de aranhas no teto, com um único banheiro... e pela primeira vez percebo que vou sofrer, que não será tão fácil como das outras vezes. Não me refiro a um sofrimento negativo, mas a um sofrimento saudável, como quando um filho vai para a faculdade ou se casa.
Pela primeira vez eu levarei lembranças boas daqui. Lembranças do silêncio que me acalmou todas as vezes que cheguei do trabalho. Lembranças da visão das árvores e dos pássaros que tenho da minha cama. Lembranças de cada planta que cultivei, do gramado que plantei, das frutas que colhi, dos espaços que criei e nem consegui usufruir. Lembranças de cada reforma que fiz. Lembranças dos meus cachorros felizes me esperando para ganhar um agrado. Lembranças do meu poço. Lembranças da minha rede e até das formigas que comeram a minha roseira. Lembranças dos vizinhos que aprenderam a me respeitar como a dona da casa. Lembranças de andar toda rota, de chinelos e meia pela rua. Tantas lembranças boas, de conquistas, de crescimento pessoal. Eu sentirei saudades. Sim, eu sentirei saudades. Como é bom sentir saudades. Saudades é a expressão máxima de que se amou.
São sete anos, um ciclo todo de vida, de renascimento, reestruturação e re-significação. Sete anos. O número místico por excelência, o céu e a terra juntos. O divino e o humano. Diante deste carinho do mistério, eu me dobro e me calo.
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