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domingo, 25 de agosto de 2013

11. A maior revolução acontece no coração



            Três dias se passaram desde o infarto. Recuperava-se pelos remédios, descanso e carinho das visitas, mas lhe faltava alegria. Passou a ficar carrancudo e deixou de rir das falações e graças dos netos. 

            Ao mesmo tempo, Esperança encontrava-se em clima de revolução. Desejavam notícias do cultivador. Pardal geralmente ficava pela varanda ouvindo as conversas, voltava correndo e contava tudo para Rosa-Flor, Pinheiro-Silvestre, Sempre-Viva, Terra, Cenotita, e todos da horta. As Cenorrabas se esforçavam por entender o que acontecia, e assim, aos poucos, apreendiam os sentimentos tão naturais aos outros. Eram um pouco atrapalhadas. Riam quando era hora de chorar e choravam quando era hora de rir.

            - Precisamos fazer alguma coisa por nosso cultivador! – exclamou Rosa-Flor.

- Mas o que podemos fazer? Os médicos já estão fazendo o melhor por ele. Quem somos nós para ajudá-los? – afirmou Pardal.

- Discordo de você Pardal. Não sei exatamente o quê, mas também acho que devemos fazer algo. – disse Pinheiro-Silvestre com ar reflexivo.

Os outros os olhavam com olhos sedentos, como se perguntassem: “O quê? O quê fazer?”.

Rosa-Flor mexendo suas pétalas e aguçando os espinhos, como costuma fazer quando está tentando resolver uma grave situação respondeu:

- Primeiro precisamos entender porque nosso cultivador ficou doente.

Enquanto falava, todos a observavam atentamente com os corações esperançosos por uma grande idéia:

- Nosso cultivador sempre nos amou muito.

            Rosa-Flor falava e todos concordavam com a cabeça e um sussurrado hã, hã.

- Ele sempre nos foi muito bom, nos regava todas as manhãs, nos podava, nos adubava, enfim, sempre fez tudo por nós. Até que, aquele vizinho intrometido apareceu com as tais sementes perfeitas que em pouquíssimo tempo modificou toda Esperança. Nós que antes éramos uma família, agora somos estranhos uns aos outros, e o pior, estranhos a nós mesmos.

            Pinheiro-Silvestre acompanhando o pensamento de Rosa-Flor continuou:

- E foi justamente aí que tudo começou. Nosso cultivador passou a olhar para Esperança sem vê-la, sem reconhecê-la; àquela a quem tanta atenção dedicou. Aos poucos foi se sentindo estranho em sua própria casa. As coisas deixaram de fazer sentido e com isso a tristeza foi chegando, chegando, e o coração sofrendo, sofrendo, até que...

- infarto! – concluiu Pardal.

            Todos entenderam e queriam comentar ao mesmo tempo. Folhas de Urtiga revoltadas começaram a gritar:

            - Morte das Cenorrabas!!! Vamos acabar com elas!!!

            O que era silêncio transformou-se em gritaria. Uns queriam agredir as Cenourrabas, outros choravam, Pinheiro-Silvestre tentava acalmá-los, Rosa-Flor pedia silêncio, ordem, assim não seria possível continuar a conversa. Pardal levou um tapa de uma folha de Urtiga, ficou cheio de coceiras, revidou bicando uma folha e nervoso começou a gritar:

- Parem!!!!!!

            Silêncio geral, susto, indignação, perplexidade. Todos se voltaram para o lugar de onde vinha aquele inesperado berro e viram Cenotita vermelha de emoção. Engolindo em seco sua raiva perante aquela situação, respirou fundo e em tom mais brando, porém firme, explicou:

            - Assim vocês não conseguirão nada, nada, nada. Está tudo errado. Agora não é o momento para vinganças e sim para nos unirmos.
           
            Vozes ecoaram:

             - Seria isto possível? Como? Loucura! Você é jovem demais e não sabe do que está falando! Cala a boca. Fica quieta sua fedelha... Você mal saiu da Terra e vem se meter em assuntos desse porte? 

          Vozes bradavam:

           - Nós temos é que resolver esta situação e deve ser agora! Já faz tempo que estamos esperando para nos livrarmos destas intrusas esquisitas, as Cenorrabas.

Alguns empolgados gritaram apoiando o discurso inflamado. Contra a jovem só lhe restava o orgulho e a força da idade.

- Eu sei que ainda sou muito jovem e quase nada sei sobre a vida. Mas o que sei e acredito é que as maiores revoluções acontecem dentro dos corações. Não com a força da ventania que nos obriga a encolher, mas com o acarinhar do sol. As Cenorrabas não têm culpa alguma sobre sua própria existência, mas já que existem devem ser respeitadas e amadas. Porque a vida deve ser respeitada acima de tudo. É isto o que sei e acredito.

- Você tem razão Cenotita – afirmou Rosa-Flor, assumindo a articulação da discussão. – Já que temos esta consciência, vamos nos preocupar em fazermos algo por nosso cultivador. Ao invés de nos dividirmos, vamos juntar nossas forças. Um mensageiro irá até o canteiro das Cenorrabas para convidá-las pra uma reunião ainda esta noite. Gostaria que Amor-Perfeito fizesse isso. Converse com elas, faça-se entender nem que seja por gestos e traga-as para a reunião.

Todos voltaram aos seus canteiros, comentando quase em sussurro o que tinha acontecido.

(Continua...)

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