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terça-feira, 6 de agosto de 2013

Pensar entre si

        
        De vez em quando minha avó me visita. Somos praticamente vizinhas, mas pela correria da vida ficamos tempos sem nos ver. Ela tem a chave da minha casa. Já aconteceu de eu dormir à vontade e acordar com ela sentada nos pés da minha cama e eu ficar constrangida de levantar.

        Hoje a tarde ela resolveu aparecer, sentou-se cansada na beira da minha cama, desta vez eu não estava dormindo, mas trabalhando no computador. Como ela começa uma narrativa e não para enquanto não se cansa de falar, fomos para a sala, e eu, muito atentamente me disponibilizei a ouvir vários "causos", desde um acontecimento do bairro até a vida da inquilina que vai receber o safado do marido de volta, o motorista do ônibus que a espera subir até o último degrau, a pomada que ela pegou grátis do posto de saúde, o cachorro do vizinho, aqui entenda-se cachorro no duplo sentido, que largou da mulher para fugir com uma "putinha", o parente que resolveu aparecer depois de tantos anos e agora tem um carrão e é metido a besta e tantos outros que simplesmente não prestei atenção.

        Com o passar do tempo aprendi a ouvir sem escutar, pois alguns casos se repetem e são sem solução, por isso de nada adianta palpitar. Sempre balanço a cabeça e solto algumas expressões, ora de concordância, ora de espanto, ora de admiração, ora de tristeza, ora de alegria e assim vamos. Sua surdez quase não permite que ela me compreenda. As poucas vezes que tentei interagir ela me pediu para não gritar, porque justamente naquele dia estava com o aparelho. 

        Minha avó é uma leitora voraz e quando morou no interior de São Paulo, leu toda a biblioteca da cidade. Agora ela já parou de procurar livros novos na minha estante, o que me leva a observar que há tempos não compro livros, o que já me fora uma compulsão. Penso que sua propensão a falar seja desse excesso de leitura, talvez minha habilidade e gosto pela escrita seja uma herança genética sua. 

        Algumas de suas expressões me são bastante engraçadas, principalmente a "pensei entre mim". Sempre que ela narra um fato que lhe pareceu estranho ou exigiu alguma decisão de sua parte ela diz: "Eu pensei entre mim e fiz tal coisa", e fico imaginando como seja "pensar entre si".

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