- Não
pisa no meu pipa! – bradou um dos meninos.
- Desculpa! Eu
não vi a linha.
As
férias passavam sem que percebessem. A vida em Céu Azul era como um paraíso
para os pequenos urbanos. Brincavam o dia todo e se não fosse o avô insistir,
nem se lembravam de voltar para casa na hora das refeições. Mesmo após o jantar
costumavam sair para a rua em grupinhos, contar piada, programar as aventuras
do dia seguinte ou contar as estrelas, as estrelas que não podiam ser vistas na
cidade.
Por seu lado o agricultor fazia o que podia
para esquecer sua antiga Esperança. A presença dos netos o mantinha ocupado e
distraído durante o dia. Já, ao anoitecer, se sentava na varanda e conversava
com seu passado. Ás vezes até falava em voz alta ao lembrar do tempo em que
seus filhos eram pequenos. Recordava as travessuras e as doenças de infância
que o deixavam tão preocupado, principalmente quando a filha teve caxumba, e, ardendo
em febre em seus braços com os outros dois pequenos também solicitando o colo,
pensava na esposa, Maria Rosa, mulher extraordinária, meiga, terna, dedicada e
forte como uma rocha, que enfrentara a seu lado todos os problemas que a vida
lhes trouxera.
Fase
difícil que o fizera a pensar em novo casamento. Chegou a conhecer algumas
mulheres, mas quando olhava para os filhos e pensava na possibilidade de não
serem aceitos pela madrasta, logo desistia. Numa noite muito chuvosa, dessas que
parece vir com o propósito de colocar à prova os medos, um raio atingiu uma das
árvores do quintal derrubando-a em cima do telhado, e se não bastasse o susto e
as goteiras por toda a casa, as crianças ardiam em febre por causa de um surto
de gripe. Pensou não ser justo o que passava e que não aguentaria cuidar e
educar sozinho as crianças. Talvez tivesse sido melhor ele morrer e não sua
querida Maria Rosa, porque as mulheres sempre são mais fortes nestas ocasiões.
Agora
percebia que todo sofrimento valera, que seus filhos estavam criados, educados
e frutificados. Embebido em suas recordações, nem percebeu a neta se aproximar.
A menina o abraçou por detrás da cadeira assustando-o.
- Que gostoso, Carol. Eu queria que todos os
avô do mundo tivessem uma netinha assim como você que gosta de abraçar seu velho
e feio avô.
Encostando
o rosto no rosto meio barbudo do avô disse:
- E eu queria
que todos os netos e netas do mundo tivessem um avô igual a você pra abraçarem.
Ficaram
assim por alguns instantes olhando para o céu estrelado.
Lui
se levantou latindo com as orelhas em pé, olhando em direção à horta,
atrapalhando assim a belíssima cena.
- Quê foi Lui?
– perguntou em tom de repreensão.
O
cachorro não parava de latir em direção à horta. Avô e neta apreensivos olhavam
para o local e não viam nada de errado. De repente o cachorro saiu correndo pela
horta.
- Lui! Volta
aqui!
Um
leve frio na barriga, um sentimento de medo percorreu sua espinha da menina que
ficou mais próxima do avô.
- O quê o Lui
tem vovô?
Abraçando-a
entrou na casa.
-
Num sei minha fia, os cachorro tem a audição muito aguçada. Ele deve ter
escutado algum rato do mato andando por aí. Num é nada demais. Vamo entrá que
já tá esfriando.
(Continua...)
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